Centrão da Amazônia, dia totalmente normal na tribo fictícia, e bota fictícia nisso, dos Omisbranqui. Qualquer semelhança com alguma tribo real e muito grande, é coincidência e coisa da sua cabeça. Fique dito.
O cacique acorda e toca seu instrumento de cordas até que toda a tribo esteja de pé para o desjejum. Todos amam esse momento. Menos quem não gosta. Dia quente. Inverno.
Era um dia importante aquele. O Cacique ouviria as opiniões de todos os índios influentes da tribo e das tribos vizinhas. Dia em que discutiriam a derrubada de árvores e, principalmente, as queimadas que eles andavam provocando. Sabe como é. Fazer fogo pra esquentar a janta e a faísca cai pro lado errado. Fogueirinha pra aquecer e deixa ela lá acesa. Essas coisas. Etecétera.
O evento foi ali mesmo, na oca de eventos quatro, na parte leste da tribo dos Omisbranqui. Afinal, era a tribo com maior população. O cacique da casa, com duas índias o abanando, começou a reunião de forma digna, prolixa e imponente:
– Que que nóis faz com esses fogo todo ai? Dá pra ver daqui ó – e apontava pro horizonte.
Um caçador da aldeia vizinha logo respondeu:
– Não vejo problemas em derrubar algumas árvores aqui, outras ali. Tem muita árvore. Nem vai dar pra usar tudo. Foguinho ali jajá acaba – e apontava pro horizonte, com o dedo um pouco mais abaixo do que o do cacique.
– Vejo problema também não. Meus antecessores sempre mudaram a tribo de lugar quando acabava as coisas verdes e tudo virava cinza – disse o cacique.
Nesse exato momento, um adolescente com cara de assustado, filho de alguém, se levantou e disse:
– Aquele fogo que vocês apontaram parece grande. Tá vindo pra cá – e apontou para o fogo, enquanto era silenciado por alguém.
Mas mesmo assim, todos se entreolharam, voltando para a discussão. Começando pelo cacique.
– Pensando bem, dá pra queimar só metade do que tá ai. Pra que queimar tudo? Deixa um pouco pros nossos netos. Vai que eles usam.
O caçador, o mesmo, respondeu:
– Cortar menos árvore e botar menos fogo. Decisão arrojada, cacique. Acho que aprovo. E complementando, mais alguém tá sentindo o calor?
Todos concordaram.
– Mas o fogo tá chegando! Não dá pra ver o final dele! – disse o adolescente assustado.
A maioria dos presentes no evento ameaçaram se levantar, mas lembraram da situação solene em que estavam e voltaram a se sentar.
O cacique, limpando o suor com uma folha seca, continuou:
– Talvez poderíamos queimar metade da floresta e plantar dez porcento? Assim as aldeias ficariam com a sensação de sustentabilidade. O que acham?
O pajé interino da tribo (o anterior veio a falecer de placebo) pediu a palavra:
– É uma ótima ideia. Assim podemos queimar metade dos dez porcento também. Cacique, não é a toa que você é o chefe! Meus parabéns.
Mas finalmente o fogo chegou até a aldeia dos Omisbranqui. Ouvia-se gritos fora da oca do evento. Todos ali estavam em uma reunião importante. Não poderiam sair. Se saíssem não seriam mais aceitos socialmente. Virariam párias. A reunião deveria continuar.
A maioria estava prestes a desmaiar de calor e falta de oxigênio. A oca começou a queimar e nenhum dos presentes sabia a dança da chuva. Desaprenderam tudo quando lhes foi ensinado o dom da faísca.
Surpreendentemente, no meio de tudo aquilo, o cacique como numa grande epifania, num surto de inteligência rara, levanta e grita:
– Pensando bem, sou contra o desmatamento e as queimadas! Sou a favor do meio ambiente! Sem ele, não poderemos viver! Sou genial, não sou?
Todos, emocionados, gritaram em uníssono:
– Nós também concordamos!
E morreram queimados.