O assassino da faquinha de rocambole

Assassino da faquinha de rocambole

Como o título do texto já diz, essa é a história de um famoso serial killer, que viveu nos anos 80.

O nome verdadeiro dele era Josimar. Ele sempre se apresentava como “Josimar, que gosta de matar”. Matança que tentava fazer com uma faquinha de rocambole. Rosa. De dez centímetros.

Alguns críticos de assassinatos diziam que essa era a forma mais cruel que já existiu de se matar alguém. A morte poderia levar de quatro a cinco anos de pura tortura. E também a troca das faquinhas, já que uma só entortaria nos primeiros minutos. Calcula-se quatro mil faquinhas para cada morte.

Mas nenhuma teoria dessas chegou ser testada. Josimar nunca conseguia matar ninguém. Sempre fugia da polícia depois de arranhar maldosamente sua vítima e deixar a pele dela vermelha com a parte de serrinha da faca.

Pura maldade. É o que todos pensamos.

Um dos casos clássicos do assassino é contado em uma certa academia de boxe. Onde Josimar uma vez tentou matar um lutador que era campeão nacional, fazendo um leve corte diagonal em sua luva. Corte este que ameaçou a desfiar o objeto por alguns dias. Até o lutador levar para alguém arrumar. Sorte.

Está também nos arquivos desse homem abominável, a vez que ele entrou em uma festa infantil para assassinar os pais da criança. Terrivelmente, 2% do bolo foi arruinado. Sem recuperação. A confeiteira estava dormindo aquela hora, com gripe.

Mesmo com essas inúmeras tentativas de atrocidades, Josimar nunca era pego pelas autoridades. Ele, em busca de sua primeira vítima, humilhava a polícia com sua habilidade colossal em deixar pessoas vivas e sem rastros de sangue. Indetectável.

Essa dança poética entre potencial assassino e polícia foi se estendendo até meados de 1988. Quando finalmente o primo de Josimar contou-lhe que a faca de cozinha, conhecida popularmente como faca, era mais efetiva para matar pessoas do que a faquinha de rocambole.

No começo, Josimar desconfiou. Mas depois tentou cortar um rocambole com a faca e conseguiu. Coisa que nunca tinha feito com a faquinha rosa. Era um novo dia. O maior assassino da história poderia, finalmente, florescer.

Depois de meses de treino para se acostumar com o peso da nova arma, o grande serial killer saiu para tentar finalmente executar sua primeira vítima. A faca de cozinha estava reluzente, com o cabo pintado de rosa, por sentimentalismo. Os assassinos cruéis também amam. Só não amam as vítimas. Mas aí é pedir demais.

Chegou, finalmente, na casa de uma pessoa aleatória. Arrombou a porta e ameaçou o coitado com a faca. A pessoa tentou correr, mas Josimar, esperto como um chicote,  foi atrás e cortou o braço do rapaz. Logo em seguida, amedrontado, disse:

– Nossa, sangue! Que horror. É assim que é as coisa tudo? Esse troço vermelho ai é sangue?

Josimar nessa hora percebeu, que a escolha para ser serial killer não foi acertada. Ele era, na verdade, uma boa pessoa e tinha nojinho de sangue.

Mas era tarde para qualquer epifania. Entrou um policial pela porta, armado, orgulhoso e dizendo palavras duras em voz alta:

– Josimar, finalmente te encontrei! Você arruinou 2% do bolo da minha filha anos atrás! É hora da vingança. O rocambole dá voltas!

E atirou no peito do mais novo ex-assassino.

Mas a sorte estava do lado de Jô, como era chamado pela namorada. A faquinha de rocambole estava no bolso da camisa. Bem no lugar onde a bala do policial passou. Ele tinha colocado ali para ficar perto do coração. A faquinha era parte da sua vida. Toda rosinha.

Mas, como todos nós sabemos e, agora Josimar também, a faquinha rosa não serve pra nada.

Foi-se.

O mistério do cobertor

crônica do cobertor

Osvaldo chegou em casa cansado, depois de um dia intenso de trabalho. Logo que pisou no chão da sala, chamou a esposa e filhos para tirar uma dúvida. Intrigado.

Falou para eles que tinha visto um cobertor para vender, não lembrava onde, que tinha uma cor estranha. Meio verde, meio azul. Ele não conseguia dar um nome para aquela cor. Mas não tinha tirado foto nem nada, só podia contar como era na sua cabeça, mesmo. Estava curioso pra saber qual era aquela cor.

A família discutiu por muito tempo, sem chegar a nenhuma conclusão.

Osvaldo então, levou a discussão para o bar, com os amigos. Estava pasmo com a impossibilidade de contar sobre um cobertor para as outras pessoas, porque a cor era muito impossível de descrever. Estava com uma coceira no cérebro.

O melhor amigo dele, Roberval, foi categórico:

– É verde água, mano! Com certeza. Essa cor eu conheço, pô.

Mas o melhor jogador de truco do bairro, Olavinho, retrucou:

– Lógico que é Oliva, cacete! É óbvio! Oliva esse cobertor ai. Verde, azul. Tal. Oliva!

Ambos ficaram discutindo durante algum tempo. A discussão passou para briga. E a briga passou a pegar no orgulho. Os dois foram procurar em livros antigos suas respostas. Foram para a biblioteca municipal.

Roberval achou um livro grego, muito antigo, que cheirava a armário de vó. Lá dizia que a cor verde-água era sagrada e nutria os seios das virgens sagradas do palácio de Atenas. Ao lado, uma amostra da cor.

Osvaldo disse que a cor não era essa.

Olavinho riu e mostrou o seu livro. Era do império Romano, de 1450. dizia que a oliva era a cor da eternidade e da supremacia Romana. Vale dizer que três anos depois, o império se dissolveu. Uma amostra da cor no rodapé da página.

Osvaldo também disse que a cor não era a do cobertor.

Não obtiveram resposta alguma com tudo aquilo. Mas eram homens orgulhosos. Foram a psicólogos, analistas de cores, pintores e desenhistas. Ninguém conseguiu entender e mostrar a cor correta. Frustrando mais e mais pessoas. E mais pessoas.

O tempo passou.

Vinte anos depois, o grupo de estudo do cobertor do Osvaldo (era como se chamavam) era de trinta pessoas. Todas tentando descobrir a cor do maldito cobertor. Foi fundada a FCDC, Fundação cor do cobertor, para reunir recursos em um só lugar. Para viagens, palestras de estudiosos e cientistas coloridos do mundo inteiro.

As famílias de Osvaldo e de seus amigos estavam em frangalhos. Gastaram tudo que tinham na procura da cor. Julgavam ser a nova cor do universo. Queriam ganhar o prêmio Nobel da arte, ou algo assim.  Ficariam ricos. Dariam o nome de Osvaldo para a nova cor. Mas nada. As trinta pessoas do grupo estavam quase desistindo.

Quase.

Mas, exatamente vinte três anos depois do início da jornada, que Osvaldo finalmente passou em frente a loja que vendia o cobertor. Parou atônito ao olhar pela vitrine. Ele ainda estava lá! O mesmo modelo, mesma cor! Igualzinho! Parecia que o tempo não tinha passado. Um milagre cobertorístico.

Ligou para todos da FCDC e pra família. Chamaram também Bill Gates, que financiava uma parte do projeto. Se encontraram todos em frente a loja e finalmente descobriram a grande e aguardada verdade.

Osvaldo era daltônico.

Era laranja, a cor.

Astolfo, o ET curioso – Pandemia

Pandemia Astolfo

Olha só. Estava eu, de máscara, indo comprar comida, quando uma nave espacial pousa na minha frente. Exatamente 2 metros a frente. De lá saiu alguém, com máscara e álcool gel na mão. Respeitando o distanciamento social.

Olhei desconfiado, mas logo reconheci. Aquelas antenas e aquela cor verde, não poderiam ser de outra pessoa. Era o Astolfo, o ET curioso que sempre vem tirar dúvidas comigo sobre o comportamento humano. Ele me escolheu, por algum motivo que até hoje, não entendi. Bom pra mim. Tem história pra vocês.

Mandei um “oi” de longe e o chamei para ir pra casa, sempre com aquele distanciamento um do outro.

Ele me disse que assim que soube da Pandemia na Terra, veio correndo para saber se estava tudo bem. Ficou legitimamente preocupado com todos nós. Estudou muito sobre o que acontecia, por isso chegou todo preparado.

– Estamos indo. Vamos sobreviver. Eu acho – respondi.

Mas ele também disse que, muitos anos trás, o planeta dele também passou por algo parecido. Mas resolveu em três meses, com o cientista mais inteligente do planeta coordenando. Era o primo dele, por sinal.

– Posso dar algumas dicas para os humanos – ele disse, esperançoso.

– Mas não acho que vão querer te ouvir – respondi.

Isso deixou Astolfo peculiarmente curioso.

– Mas eu tenho experiência interplanetária no assunto. Porque não me ouviriam?

– Então, por aqui, tem gente que não dá ouvidos aos especialistas da área médica.

Astolfo me olhou curioso. Já preparei uma limonada para ele, porque eu sabia que era a única coisa que o acalmava.

Mas ele disse:

– Agora para me acalmar, só bolinho de abóbora.

Pedi para entregarem. Eu precisava ter alguns bolinhos de garantia, porque o papo ia ficar tenso. Com certeza.

– Mas qual o motivo de não darem ouvidos para quem é da área médica em uma pandemia? – perguntou enquanto saboreava o bolinho lentamente.

– Bom, acredito que seja por razões políticas – respondi.

Astolfo ficou pensativo, tentando entender a minha última resposta. Mas depois de ponderar por longos um segundo, falou:

– O seu povo mistura um caso de saúde mundial com política?

– Bom, alguns líderes políticos chamaram a pandemia de gripezinha em rede nacional. Fizeram campanha para o país não entrar em quarentena.

Ele mastigou o bolinho que tinha em mãos com mais ferocidade. As anteninhas dele se trançaram. Mas continuei.

– Os mesmos políticos, quando a pandemia começou a matar mais pessoas, pegaram um medicamento sem os testes necessários e falaram pra população tomar. Em rede nacional.

– Mas

– por que? – disse ele, em duas linhas, como de costume. Perplexo.

– Talvez pra jogar a culpa da posterior queda econômica em outras pessoas, e fingir que não tem nada a ver com isso. Sabe como é.

– Não,

–  não sei como é – estava ficando vermelho.

– Reeleição. Eles tem medo de que, quando economia sofrer um baque, não seriam reeleitos nas próximas eleições.

– Não seria mais inteligente salvar vidas, se importar com o bem estar e saúde das pessoas?  Não geraria mais simpatia e, consequentemente, mais votos?

– Suas quatro primeiras palavras anularam seu argumento – respondi, triste.

Continuei a explicar:

– Tem até empresário falando que, a morte de milhares de velhinhos, é um preço a se pagar para ficarmos bem economicamente.

Senti um bolinho grudando no meu teto. Vou ter que limpar. Astolfo estava espumando e tremendo, tive que amarrar o pé dele na mesa.

– E os políticos que se opõem a esses daí? O que falam?

– Ah, alguns roubaram bilhões da saúde no passado. Outros falam o que o povo quer ouvir para se reelegerem também. Não dá pra confiar, sabe?

– Não sei não. Vocês não podem confiar nas pessoas em que votam e que representam vocês nessa tal democracia?

– É o que parece.

– Então qual o sentido de todo esse sistema?

– Ninguém sabe, mas somos muito burros pra criar outro que funcione.

– Mas esse não funciona! Seu povo é bárbaro! Como sobreviveram até hoje?

– Ao ver por essa pandemia, só faltou o vírus certo.

Astolfo parecia exausto. Tremia de loucura. Enfiei mais três bolinhos pela goela dele. Melhorou um pouco. Se sentou, com dificuldade. Perguntou:

– Mas ao menos a maioria da população ouve a ciência e está se isolando, correto?

Contei pra ele, que grande parte estava de acordo com os políticos que negavam a ciência. Que saíram pra rua para fazer manifestação e memes com caixões. Que o presidente abraçava e apertava as mãos de pessoas na rua. Que políticos grandes compartilhavam gráficos simples na internet e não sabiam interpretar. Gráficos de quinta série. Que algumas pessoas chamavam a organização mundial de saúde de comunista e que planejava dominar o mundo.

Falei, por fim, que uma parte do povo não dava ouvidos para um biólogo com mestrado em virologia. Mas sim, davam ouvidos para um capitão do exército e um astrólogo.

Astolfo teve um treco. Pensei em levar ele para o hospital, mas não tinha leito de UTI sobrando. Não valeria a pena tentar. Coloquei ele na nave dele e apertei o botão de decolagem.

Encostei nele para coloca-lo na nave.

Se ele sobreviver, não acho que volte com a cura.

O Líder

Jogador de futebol do exército

Essa é uma crônica daquelas pontuais que costumam ir nas colunas de jornal semanal. Se você estiver lendo depois do meio de 2020, ela fará pouco sentido se você não se lembrar do contexto do começo do ano no Brasil.

 

Era uma rua normal nos anos noventa. Muitas crianças na rua, jogando bola, correndo, caindo e chorando. Gritando, pulando, caindo e chorando. E eram crianças bem diferentes. Caindo e chorando.

Fizeram, como em quase toda turma de amigos naquela época, um timinho de futebol. Um time de cinco meninos que iriam jogar contra as outras ruas do bairro. Coisa básica e corriqueira.

Quem deu a ideia e criou o time, foi o Jairzinho. Ele tinha repetido a terceira série tantas vezes que acabou tendo moral na rua. Virou o capitão do time. Era bem rico. O que ajudava.

Chamou outros quatro que julgava serem os melhores jogadores que conhecia. Mandinho, Paulo, Serginho e Damasco. Escolha puramente técnica. Dizia ele. Sem saber o que é técnica.

Mandinho era um goleador nato. Fazia gols em todos os jogos que disputavam na rua. Já Paulo era um grande passador, jogava ali na armação e tinha pinta de gênio. Serginho era brucutu, forte e um pouco desengonçado. Um bom defensor. E Damasco era muito rápido com as mãos e bom goleiro. Falava que Jesus defendia pra ele.

Jairzinho já foi marcando logo o primeiro jogo. Ele gostava de atacar também e fazia a dupla de frente com o Mandinho. Então logo no primeiro embate, ganharam de cinco a zero. Cinco gols do Mandinho. Ou Mandator, como foi apelidado.

Todos foram comemorar na adeguinha da esquina. Pagaram muitas balinhas com troco do pão pro artilheiro. Ele sorria. Apesar de só tinha feito o que treinou bastante. Nada além do básico.

Depois de algum tempo, começaram a voltar para as respectivas casas.

Ao chegarem aos portões da casa do Damasco, como sempre faziam antes de se despedir, Jairzinho, o capitão, falou:

– No próximo jogo, Mandinho vai sair do time.

Ninguém entendeu nada. O amigo tinha acabado de fazer cinco gols e iria sair? Paulo tentou argumentar:

– Mas Jairzinho, você tem certeza? Você tá na Disney? Minha empregada foi esse ano pra lá. Sei lá.

E, sem pestanejar, o capitão respondeu:

– Sim. Ele tá se achando demais, muito popular. Eu mando. Eu sou o capitão! Amanhã ele não joga. Tá ok?

Todos tiveram que acatar, já que Jairzinho era o capitão do time e dono da bola. Só ele tinha dinheiro pra comprar uniformes e tudo mais.

Logo no outro dia, as outras crianças da rua ao ouvirem o que tinha acontecido, foram reclamar direto no portão do capitão. Todos estavam com muito medo do substituto do Mandinho. Finalmente anunciado.

Era um menino chamado Osmar. Que nunca jogou futebol e tinha os dois pés tortos. Mas adorava bajular o Jairzinho o dia inteiro. Idolatrava o capitão do time. E, vendo aquela aglomeração na casa do seu capitão, falou em voz alta para todo mundo ouvir:

– Fazer gols é prejudicial ao time. Tenho uma tabela aqui provando!

E mostrou uma tabela do campeonato russo de polo aquático.

Todos o ignoraram e continuaram a pedir a permanência do Mandinho. Permanência que foi veementemente rechaçada pelo Jairzinho. Nada iria convencer ele do contrário. E se foram pro jogo do jeito que o menino rico queria.

O jogo era contra o time da rua Coroa Vênus. Time forte, imbatível até o momento. Diziam por ai que todas as outras ruas tinham medo de jogar contra eles e resolviam ficar em casa. O saldo de gols deles era grande, principalmente contra a rua da Bota.

Mas Jairzinho não ligava pra isso. Treinou futebol desde pequeno, praticamente um atleta infantil. Corajoso. Entrou de cabeça no desafio.

O jogo tinha dois tempos de trinta minutos. Nos primeiros vinte, o time da rua Coroa ganhava de vinte e sete a zero. Osmar não conseguia ficar em pé direito, não tinha coordenação.

Jairzinho então, em um ato de amor à rua e orgulho, pegou sua bola e foi pra casa. Deixando time e torcida lá, naquele massacre. Mandinho entrou no time correndo, mas já era tarde. Tarde porque haviam várias bolas além da do Jairzinho.

E todas elas dentro do gol do Damasco. Especialistas de futebol estimaram um milhão.

De volta para o passado

cronica portal

Numa conversa de bar, Paulo ouviu de algum amigo mais-do-que-bêbado, sobre a existência de um portal que voltava ao passado.

Sim. Uma porta misteriosa que iria permitir que quem a trespassasse, voltasse para algum tempo atrás e pudesse fazer o que a mente escolhesse. Paulo, que estava tão bêbado quanto o amigo, achou a ideia maravilhosa e colocou na cabeça que no dia seguinte sairia a procura. Portal esse que, segundo o amigo, ficava no meio da floresta amazônica. Conveniente.

Falou com sua mulher que, claramente, foi veemente contra a viagem. Já que eles moravam em Belo Horizonte, ele perderia dias de trabalho e deixaria esposa e filho sozinhos.

– É perigoso – disse ela.

– Sei me cuidar – disse ele.

Depois de muita discussão nesse tom acalorado, ele ganhou. Saiu de casa no dia seguinte, às 5 da manhã, para procurar o tão sonhado portal. A porta que levaria Paulo para o passado. Para tempos que já estavam somente na memória dele e de todos os outros. Reviveria e respiraria o ar que já havia respirado. Emoção. Tremedeira.

Chegando lá, pediu indicações para moradores das cidades pequenas ao redor da floresta. Ninguém sabia de muita coisa. Somente um senhor de 115 anos de idade, disse lembrar a localidade exata. Disse que ia contar em detalhes, mas cinco segundo depois esqueceu onde estava, falou que era o Batman e foi levado para o quarto, para tomar remédios.

Paulo não desistiu. Entrou na floresta sozinho, disposto a achar por conta própria a grande entrada. O portal. Era algo muito valioso para se perder assim, no meio do nada. Se você considerar milhares de árvores como nada.

Bom, passaram-se muitos meses. Paulo tinha enfrentado gnomos assassinos, índios possuídos pelo demônio, lagartos gigantes que pareciam dragões e macacos pequenos que pareciam carneiros. Estava exausto, cansado e muito mais magro. Tinha perdido um braço, todos os dentes e uma orelha. Tinha esquecido como falar português. Só conseguia fazer um barulhos estranho com a boca.

Apesar disso tudo, aprendeu a sobreviver na selva e estava começando a gostar da ideia. Mas lembrou da mulher, filho e do emprego. Estavam lá sem dinheiro há muito tempo. Talvez ela já tivesse achado outro. Em breve já faria um ano que estava na procura. Mas isso não era preocupante, pensou ele. E disse em voz alta para confirmar:

– Ahn pruu raaaa tututu gaaaahhs puf papa uuu.

Que na mente dele, soava algo como voltar no tempo com o portal e recuperar tudo que perdeu. Até as calças, que já lhe faltavam.

Quando completou um ano de floresta, Paulo, que já tinha perdido até um dos pés, saltitando, encontrou o local. Um ano. Finalmente.

Estava em uma clareira, no coração da floresta amazônica. Um portal de cristal, no meio do nada, com um homem ao lado, de chapéu branco e um cajado na mão. Tudo brilhava muito e Paulo teve a certeza de que ali era o local.

Ao se aproximar, o guardião da porta falou num tom que daria pra ouvir do outro lado da floresta:

– Grande viajante, a porta que leva ao passado está aberta. Apresse-se e entre!

E tudo brilhou. O portal se abriu.

Paulo visivelmente emocionado, com a chance de recuperar seu corpo, sua dignidade e, possivelmente sua esposa, chorou. Entrou aos prantos pela porta, correndo.

Ao passar pelo portal, chegou numa clareira e ouviu a voz:

– Grande viajante, a porta que leva ao passado está aberta. Apresse-se e entre!

E tudo brilhou. O portal se abriu.

Instawar

logo do instagram para crônica texto curto

Era uma festança! Eu acho que foi, ao menos.

O dia era 1º de setembro de 1939, cidade de Frankfurt an der Oder, divisa da Alemanha com a  Polônia.

A festa estava sendo dada pelo tal de Führer lá. Não lembro direito. Um tal de Joseph Goebbels tinha divulgado as festividades e o amigo Reinhard Heydrich organizou a segurança. Sem registro fica difícil saber de tudo. Mas é mais ou menos isso dai.

Poloneses e alemães estavam curtindo um descanso merecido depois dos anos sofridos que tinham passado. A festa era um pretexto perfeito pra respirar fundo e seguir um futuro feliz e próspero. É o que eu ouvi.

Felicidade é o que não faltou no local: Um general bebeu mais do que podia e abaixou as calças mostrando a cueca com estampa de gansos. Um conselheiro de guerra tomou um fora de uma estátua e tinha mais gente passando mal e rindo do que consciente. Talvez.

Mas alguma coisa estava faltando e ninguém sabia. Como uma sensação de falta de queijo no macarrão. Uma nuvem de chuva num dia ensolarado.

Aquela sensação foi tomando conta de todos os presentes. Até do senhor Adolfo, o Führer lá. Sensação chata que parecia uma coceira no cérebro.

Era registro! Sim. Um dos generais conseguiu descobrir o que era aquela estranha sensação. Faltavam fotos, vídeos e comentários sobre a festa. É claro!

Imediatamente todos os presentes na grande festa pegaram lápis e papel e começaram a desenhar os acontecimentos. Alguns escreviam uma legenda no desenho. Foi visto um estrategista de guerra polonês fazendo bico de pato por 45 minutos em direção a um alemão  que desenhou um boneco de palito.

Tentaram.

Mas não adiantou. Sem registro, sem fotos,  sem nada, a festa não estava acontecendo.

– Se não postou, não aconteceu – Adolf Hitler, 1939.

O Instagram não tinha sido inventado. Aquela festa não poderia acontecer. Na verdade, ela estava acontecendo e não acontecendo ao mesmo tempo. Erwin Schrödinger estava na festa e começou a pensar em gatos.

A festa não chegou ao seu final. Todos estavam muito deprimidos e revoltados com a falta de stories para relembrar o que tinha acabado de acontecer e testar quem ganhava mais likes nas fotos. Nenhum deles tinha a menor ideia, mas era isso aí.  Não era dor de barriga, como pensavam.

O Führer estava emburrado e andando com os amigos para o leste. Mas encontrou Chamberlain, o Ministro inglês, bêbado, logo ali na fronteira dos dois países.

– Não passem daqui, senão vou gorfar em vocês – disse ele, num inglês extremamente refinado.

O resultado dessa conversa todos nós sabemos. Registraram tudo em muitos livros e com muitas fotos.

Mas a festa, não.

Sinceridade

político rindo

Nossa. Tá escuro.  Ah, clareou, abri os olhos. Acho que acordei. Bom, acho que é isso. Melhor me levantar da cama. Vou para mais um dia duro de trabalho. Não sorria ao pensar isso Ademar. Foco.

Esse meu  trabalho é importante. É importante para o país, para o povo brasileiro e para as futuras gerações. Ademar, para de mostrar esses dentes ao pensar essas coisas. Não é engraçado. Foco. Cara séria. Tenho que me condicionar a pensar que é por isso que escolhi a profissão. E não porque quero ficar rico e ter certo tipo de poder. Olha lá, falando a verdade eu não sorrio. Engraçado.

Estou pronto para meu desjejum. Já consegui controlar meu sorriso involuntário. Posso encarar minha mulher e filho de forma aberta. Eles me amam. Todos tem orgulho de mim. Ademar, paizão e político exemplar. Um marco na história brasileira. Sou honesto e trabalhador. Cheguei na cozinha. Lá estão eles. Afe.

– Ademar, posso saber qual é o motivo do sorriso gigante no rosto?

Droga. Não adianta. É impossível pensar essas coisas e não achar engraçado. Vou ter que inventar qualquer desculpa. Vamos ver.

– É a felicidade de acordar em mais um dia lindo destes para ajudar o Brasil a florescer.

Nossa, não aguentei. Gargalhei. Nossa, cuspi o café no meu filho. Queimei ele. Minha barriga tá doendo. Socorro. Água. Mão tremendo, não consigo.

– Ademar, o que é tão engraçado que te fez sujar todo o coitado do Enzo?

– Nada amor, lembrei de uma piada. Só isso. Me desculpe, filhotinho.

Se concentre Ademar. Hoje você tem uma entrevista para o maior telejornal do Brasil. E é em horário nobre! Vai ter que falar as besteiras e não pode rir. Foco, força e falácia.

Bom, estou aqui no meu Porsche em direção ao meu glorioso trabalho de deputado. Nossa, parei. Melhor pensar a verdade, senão posso bater o carro. Como pensar essas besteiras é engraçado. Não vou conseguir dar a entrevista. É sobre educação básica. E eu sei que eu estou pouco me fodendo pra criançada. Isso vai ser um desastre. Preciso treinar mentalmente ainda. Muito.

Cheguei na câmara. Tenho um dia inteiro de trabalho até chegar a hora da maldita entrevista. Com’on Ademar! Não ria disso. É sim, um trabalho. Eu ganho, e muito, pra estar aqui. Eu faço umas porcarias nesse prédio que podem ser chamadas de trabalho. Pare de rir, pelo amor de tudo que é sagrado. Chutei a lixeira enquanto cambaleava. É hoje, viu.

Finalmente estou no meu gabinete. Aqui posso pensar o que quiser e rir de qualquer coisa que ninguém vai suspeitar. Na verdade eu invejo os amigos de profissão. Eles conseguem mentir sem mudar em nada a expressão facial. Incrível. Eu não consigo. Ainda bem que a minha campanha foi feita pelo marketing. Se eu fosse falar algo, nossa senhora. Preguicinha.

Nossa, cochilei. Que horas são? Ah, já tá perto da hora da entrevista, vou direto pro local marcado e preparar a maquiagem. Mas ainda estou preocupado. E se me perguntarem sobre as crianças e o futuro do país? Ou pior, sobre saúde e hospitais públicos? Ou então sobre política! Eu não sei nada dessas coisas. Vou ter que falar aquelas coisas que o marketing ensinou e não vou aguentar. Vou rir. Muito. Se pá eu chuto o Bonner sem querer.

Vou treinar mentalmente. Vamos lá. Eu, Ademar, deputado, considero a educação básica o alicerce da nossa sociedade. Sem ela, o futuro…

Não consigo. Desde que pensei a palavra “futuro” até agora eu passei vinte minutos gargalhando dentro do carro. Parei o carro no acostamento, quase bati. Estou com dor na lateral da barriga. Não, na barriga inteira. Nossa, como isso é engraçado. Pareço um maníaco. Não vou conseguir. Serei chamado de Coringa da política. Desisto.

Já sei. Descobri como posso resolver. Vou pra Miami. Não pago a passagem mesmo. De lá ninguém vai me ouvir. Falo que foi uma emergência política. Reunião com o prefeito de Miami. Miami tem prefeito? É cidade? Sei lá. Tem praia, isso eu sei. Que o telejornal se vire pra justificar minha ausência. O povo acredita em tudo, ninguém vai atrás mesmo. Acreditaram nos meus panfletinhos.

A educação…

Minha barriga, ai cacete.

Astolfo, o ET curioso – Presidente

Astolfo o ET curioso

Bem. Então. Usualmente, como toda quinta feira, eu estava jogando um baralho com alguns amigos. Os de sempre. Sabe como é. Buraco vai, truco vem e bum! Um clarão aparece acima de nós e alguém pousa bem ao meu lado em sua nave. Para espanto da galera.

Era definitivamente ele. Astolfo, o meu querido amigo do planeta Roxo. Sim, ele me disse que o nome do planeta é mesmo Roxo. E a cor majoritária por lá é verde. Menos os animais, que vestem rosa.

Fiquei surpreso, já que há mais de nove anos não recebia a visita dele. A última vez deixei ele confuso. Vou tentar ser mais educativo dessa vez. Prometo.

Digo isso porque o Astolfo vem pra cá estudar nossa gente. Ele tem um interesse especial pela Terra. Curte um churrasquinho grego com limonada. E é o que estava comendo quando saiu da nave. Parecia animado.

– Olá Bruno! Quanto tempo! – disse ele logo ao pisar no nosso planeta, ligando o tradutor automático.

– Olá Astolfo, que saudades! – respondi amigavelmente.

– Oh, sim! Saudades. Você me explicou da última vez. Coisinha difícil.

– Não posso negar.

– Mas o que te traz a esse cantinho do universo dessa vez? – perguntei logo em seguida.

– Vim estudar essa coisa chamada “presidente” da Terra – e ele realmente fez o sinal de aspas ao redor de grande cabeça com os dedos verdes.

– Por que? Vocês não tem presidentes por lá no Roxo?

– Não. Lá não temos esse tipo hierarquia em nossa sociedade, mas vivemos muito bem. Criminalidade nunca subiu de zero porcento. Maior taxa de educação da galáxia. Também vivemos mais de trezentos anos sem stress. E comemos glúten.

– E você quer saber o que fazem os presidentes por aqui? É isso?

– Fiquei sabendo que existiam e queria saber como vocês escolhem eles. É o mais forte do país?

– Já passamos dessa época, Astolfo. Não nos subestime tanto – eu disse, quase rindo.

– Então vocês elegem o mais inteligente?

– Er, também não.

– Alguém com muito conhecimento em administração? Gestão de pessoas? Economia e desenvolvimento social?

– Hm, não.

– Então, como? Me explique, estou curioso – Astolfo disse isso tentando imitar uma cara humana curiosa, mas um de seus olhos caiu na mesa ao lado enquanto tentava. Nada grave, acontece bastante. Recolocou.

– Bom, a população costuma decidir o presidente na maioria dos países. Mas dificilmente eles tem umas dessas qualidades que você citou acima.

– Mas como assim? Por que a população não coloca a melhor pessoa do país para governar? É simples! – Astolfo subiu um pouco a voz nessa frase, parecia incomodado.

– É que normalmente as pessoas mal conhecem os candidatos a presidência.

– O

– que? – Sim, ele disse em duas linhas. No planeta dele, falar assim significa perplexidade.

– A grande maioria dos seres humanos se importam pouco com política e entendem menos ainda. Então acabam votando no mais simpático. No que tem mais tempo de televisão e faz mais propaganda.

Ao ouvir isso, Astolfo chutou a mesa do bar. Suas antenas se contorceram e formaram um nó de marinheiro (Lais de guia) perfeito. Um marinheiro que estava por ali bêbado, tirou uma foto.

Tentei acalma-lo por cinco minutos. Tive que comprar uma limonada para fazê-lo sentar e me ouvir. Mas ele logo que sentou já continuou a perguntar.

– E esses simpáticos que foram eleitos, ficam a vida inteira aprendendo e evoluindo no cargo, fazendo um país melhor?

– Não. Eles ficam só quatro anos. Mal conseguem fazer muita coisa.

Outro ataque de raiva. Limonada. Cadeira. Pergunta.

– E as pessoas, depois dos quatro anos, elegem o mesmo ou alguém que pensa parecido, correto? Para dar continuidade ao trabalho.

– Não. Normalmente a tendência é sempre da oposição ganhar em algum momento e o trabalho começa do zero.

Eu percebi que as antenas do Astolfo começaram a ferver. Estava saindo fumaça da cabeça enorme do meu amigo. Tentei acalmar meu personal ET, falando pra ele que existem coisas piores pelo mundo.

– Piores do que essa tal democracia que vocês inventaram? Com os presidentes simpáticos?

– Sim. Tem lugar que uma pessoa manda no país inteiro, fica rico e deixa o país na miséria. Manda matar, manda prender e se intitula Deus. Até mente que controla o tempo e faz o sol nascer. Tem lugar que mulher não pode mostrar o rosto na rua. Tem lugar que se mata por religião com consenso do governo, Et cetera.

– Ao menos por aqui os presidentes simpáticos não são idiotas assim. Correto?

Bom, como vocês sabem, sou uma pessoa muito honesta. Fiquei com pena de ocultar informação de um amigo tão especial. Contei pra ele que já tivemos um presidente de saco roxo que nos roubou, um analfabeto bêbado, uma estocadora de vento e um cara que pergunta sobre golden shower na internet.

– O que é golden shower? – foi a última pergunta dele.

Constrangido, expliquei.

Ele começou a gritar em sua língua natal, quebrando todos os copos ao redor, desligou o tradutor e entrou em sua nave, muito mais vermelho do que verde. Olhou pra mim com pena, me deu um tchau nervoso e sumiu nos céus a toda velocidade.

Falando sério, não acho que estamos muito seguros.

Viajante do tempo

delorean

Vamos falar de teorias. Eu sempre curti muito teorias e é sobre uma delas que vamos falar agora. Senta aí.

Algumas pessoas acreditam que, se alguém for muito importante para o futuro da humanidade de alguma forma, receberá em algum momento da vida, uma visita de um viajante no tempo que vai querer saber tudo sobre você. Tipo um historiador.

Isso porque no futuro, as pessoas que poderão voltar para o passado, irão visitar figuras histórias importantes. Como alguém que tenha inventado a cura para uma doença gravíssima ou algum grande esportista histórico.

Resumindo, se você for importante pra humanidade no futuro, fique esperto, alguém pode vir te visitar para aprender como você vive. Ou viveu. Dependendo do ponto de vista.

E essa teoria era conhecida e aceita por Joseílton. Morador de 21 anos da parte sul da cidade do Rio de Janeiro. Tinha acabado de ler sobre a teoria ao mesmo tempo que ganhara um aumento de salário e uma mudança de cargo. Trabalhava em uma multinacional de tecnologia. Era um rapaz inspirado. Queria mudar o mundo. E tinha chances reais de conseguir.

Ele estava trabalhando em uma nova tecnologia que permitiria gerar energia de forma limpa em escala global. Estava somente no início mas, se desse certo, iria mudar a forma predatória com que o ser humano trata o planeta. Estava confiante.

E no meio de uma dessas semanas que sucederam a mudança de cargo, Joiseílton encontrou um rapaz da mesma idade dele na rua. Na verdade, o rapaz que o interpelou:

– Joseílton?

– Sou eu mesmo. Me desculpe, e você? – respondeu educadamente, como sempre.

– Ah cara, você não me conhece. Muito prazer, sou o Ronaldo.

– Muito prazer!

Nessa hora a cabeça de Joseílton estava a mil. Se sentiu muito importante. Iria mudar o mundo. Respirou fundo e continuou a conversa em tom amigável com o garoto do futuro.

Foram algumas horas. Depois de faltar ao primeiro turno do trabalho para contar tudo da sua vida ao Ronaldo, ele se despediu do amigo do futuro, temendo nunca mais o ver. Já que o viajante voltaria para seu tempo e Joseílton iria rumo ao sucesso e a mudança definitiva do mundo. Agora tinha certeza.

Depois de exatamente uma semana, Joseílton voltava do trabalho e percebeu a importância daquela visita do futuro.

Assaltaram a sua casa sequestraram toda a sua família.

Sem surra

 

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Era uma vez, Toninho.

Toninho tinha dois filhos que, simplesmente, amavam bolinho. Ele não sabia o motivo. Nem tinha ideia. Ele não suportava bolinho e sua mulher tampouco. Coisa de gente mais velha. Sabe como é.

Seus dois filhos, sempre muito magrinhos, ficavam o dia inteiro pedindo os tais bolinhos. Sem dar paz ao Toninho, nem sequer por um minutinho.

Tamanha encheção de saco, forçou o pai a tomar uma atitude. Ele não batia nos filhos. Sem surra. Sempre. Então proibir o uso da palavra “bolinho” dentro daquela casa, foi a solução. Censurando os dois filhos de comentar sobre qualquer coisa relacionada àquele alimento exageradamente desejado.

Censura sem surra. No mundo ideal de Toninho, estava tudo certinho.

Mas é sabido pelo mundo, que esse tipo de censura nunca dá muito certo. Temos fatos históricos que confirmam. Alguns recentes. Alguns mais antigos. Sempre com o mesmo resultado.

Sendo assim, os bolinhos foram se acumulando dentro dos filhos do toninho. Não podiam mais sair. A cada bolinho preso dentro deles, menos espaço tinha. Até que os irmãos começaram a engordar. Sim. Engordar por falta de saída de bolinhos. Acontece com qualquer um.

Toninho começou a ficar preocupado, já que os filhos magrinhos, estavam gordinhos de uma hora pra outra. Mas não ligou. Estava em paz. Bolinhos nunca mais.

Mas sem muita demora, o fatídico dia chegou. Depois de meses, os dois irmãos estavam tão gordos, tão redondos, que explodiram na cara de Toninho. Era muito bolinho trancado, que na explosão, espalhou-se bolinho por toda a Terra. Do Uruguai a Vladivostok. Uma bolota de bolinho.

Estado de calamidade mundial. Os bolinhos estavam em conflito com os seres humanos. Eram dez  para cada humano. Até na China. Crise. Guerra.

Toda a humanidade estava chocada com tanto bolinho no mundo. Nunca tinham visto nada assim antes. Era muito estranho. Bolinho na rua! Bolinho nas revistinhas em quadrinhos! Bolinho até na minha novela!

Com o passar do tempo, prenderam todos os bolinhos. Foi difícil, mas a raça humana prevaleceu a essa ameaça absurda que eram bolinhos.

Todos eles foram trancados em uma grande e gelada geladeira em uma geleira na Groenlândia. Censura mundial dos bolinhos. Sucesso. Toninho viu a notícia com um sorriso de canto de boca. Boca cheia de chocolate. Mas não era de bolinho! Ai pode!

Meses se passaram. As pessoas, ao segurarem os bolinhos dentro de si, explodiram também. Óbvio. Não se pode reprimir o desejo natural por bolinhos. Mas foi tão forte essa explosão, que os bolinhos se espalharam por um raio muito maior e dominaram a Via Láctea. Dominaram a raça humana e todas as futuras raças dos planetas adjacentes.

O primeiro bolinho que chegou ao sol foi condecorado com o título de Flambadinho -Informação útil pro texto destacada em um parágrafo separado.

Rei Bolinho Primeiro foi eleito, e seu primeiro decreto foi a censura do Toninho. Que tentou se explicar, em suas últimas palavras. Dizia que só não queria que seus filhos comessem bolinho na infância. Que julgava isso assunto de família, assunto  delicado. Tinha até amigos que comiam bolo. Um saquinho preto com um aviso no bolinho talvez resolvesse. Que não tinha nada contra bolinhagem na rua. Etecétera.

Que nada. Censuraram o Toninho.