Astolfo, o ET curioso – Presidente

Astolfo o ET curioso

Bem. Então. Usualmente, como toda quinta feira, eu estava jogando um baralho com alguns amigos. Os de sempre. Sabe como é. Buraco vai, truco vem e bum! Um clarão aparece acima de nós e alguém pousa bem ao meu lado em sua nave. Para espanto da galera.

Era definitivamente ele. Astolfo, o meu querido amigo do planeta Roxo. Sim, ele me disse que o nome do planeta é mesmo Roxo. E a cor majoritária por lá é verde. Menos os animais, que vestem rosa.

Fiquei surpreso, já que há mais de nove anos não recebia a visita dele. A última vez deixei ele confuso. Vou tentar ser mais educativo dessa vez. Prometo.

Digo isso porque o Astolfo vem pra cá estudar nossa gente. Ele tem um interesse especial pela Terra. Curte um churrasquinho grego com limonada. E é o que estava comendo quando saiu da nave. Parecia animado.

– Olá Bruno! Quanto tempo! – disse ele logo ao pisar no nosso planeta, ligando o tradutor automático.

– Olá Astolfo, que saudades! – respondi amigavelmente.

– Oh, sim! Saudades. Você me explicou da última vez. Coisinha difícil.

– Não posso negar.

– Mas o que te traz a esse cantinho do universo dessa vez? – perguntei logo em seguida.

– Vim estudar essa coisa chamada “presidente” da Terra – e ele realmente fez o sinal de aspas ao redor de grande cabeça com os dedos verdes.

– Por que? Vocês não tem presidentes por lá no Roxo?

– Não. Lá não temos esse tipo hierarquia em nossa sociedade, mas vivemos muito bem. Criminalidade nunca subiu de zero porcento. Maior taxa de educação da galáxia. Também vivemos mais de trezentos anos sem stress. E comemos glúten.

– E você quer saber o que fazem os presidentes por aqui? É isso?

– Fiquei sabendo que existiam e queria saber como vocês escolhem eles. É o mais forte do país?

– Já passamos dessa época, Astolfo. Não nos subestime tanto – eu disse, quase rindo.

– Então vocês elegem o mais inteligente?

– Er, também não.

– Alguém com muito conhecimento em administração? Gestão de pessoas? Economia e desenvolvimento social?

– Hm, não.

– Então, como? Me explique, estou curioso – Astolfo disse isso tentando imitar uma cara humana curiosa, mas um de seus olhos caiu na mesa ao lado enquanto tentava. Nada grave, acontece bastante. Recolocou.

– Bom, a população costuma decidir o presidente na maioria dos países. Mas dificilmente eles tem umas dessas qualidades que você citou acima.

– Mas como assim? Por que a população não coloca a melhor pessoa do país para governar? É simples! – Astolfo subiu um pouco a voz nessa frase, parecia incomodado.

– É que normalmente as pessoas mal conhecem os candidatos a presidência.

– O

– que? – Sim, ele disse em duas linhas. No planeta dele, falar assim significa perplexidade.

– A grande maioria dos seres humanos se importam pouco com política e entendem menos ainda. Então acabam votando no mais simpático. No que tem mais tempo de televisão e faz mais propaganda.

Ao ouvir isso, Astolfo chutou a mesa do bar. Suas antenas se contorceram e formaram um nó de marinheiro (Lais de guia) perfeito. Um marinheiro que estava por ali bêbado, tirou uma foto.

Tentei acalma-lo por cinco minutos. Tive que comprar uma limonada para fazê-lo sentar e me ouvir. Mas ele logo que sentou já continuou a perguntar.

– E esses simpáticos que foram eleitos, ficam a vida inteira aprendendo e evoluindo no cargo, fazendo um país melhor?

– Não. Eles ficam só quatro anos. Mal conseguem fazer muita coisa.

Outro ataque de raiva. Limonada. Cadeira. Pergunta.

– E as pessoas, depois dos quatro anos, elegem o mesmo ou alguém que pensa parecido, correto? Para dar continuidade ao trabalho.

– Não. Normalmente a tendência é sempre da oposição ganhar em algum momento e o trabalho começa do zero.

Eu percebi que as antenas do Astolfo começaram a ferver. Estava saindo fumaça da cabeça enorme do meu amigo. Tentei acalmar meu personal ET, falando pra ele que existem coisas piores pelo mundo.

– Piores do que essa tal democracia que vocês inventaram? Com os presidentes simpáticos?

– Sim. Tem lugar que uma pessoa manda no país inteiro, fica rico e deixa o país na miséria. Manda matar, manda prender e se intitula Deus. Até mente que controla o tempo e faz o sol nascer. Tem lugar que mulher não pode mostrar o rosto na rua. Tem lugar que se mata por religião com consenso do governo, Et cetera.

– Ao menos por aqui os presidentes simpáticos não são idiotas assim. Correto?

Bom, como vocês sabem, sou uma pessoa muito honesta. Fiquei com pena de ocultar informação de um amigo tão especial. Contei pra ele que já tivemos um presidente de saco roxo que nos roubou, um analfabeto bêbado, uma estocadora de vento e um cara que pergunta sobre golden shower na internet.

– O que é golden shower? – foi a última pergunta dele.

Constrangido, expliquei.

Ele começou a gritar em sua língua natal, quebrando todos os copos ao redor, desligou o tradutor e entrou em sua nave, muito mais vermelho do que verde. Olhou pra mim com pena, me deu um tchau nervoso e sumiu nos céus a toda velocidade.

Falando sério, não acho que estamos muito seguros.

Deixe um comentário