Na fila da cadeira elétrica

De uma hora pra outra, as leis mudam completamente e o Brasil começa a usar a famosa, nem tão agradável, cadeira elétrica como forma de punição. Veja como as coisas são, aconteceu isso daí.

É São Paulo, segunda feira, cinco da manhã e a fila para sentar na cadeira já é grande. Muitos criminosos com seus respectivos agentes da lei ao lado, muitos curiosos e outros transeuntes que só estavam passando por ali mesmo e resolveram entrar na fila. Afinal, até injeção na testa, de graça, presta.

A fritação começa às sete horas, mas como no dia anterior a cadeira “deu defeito” segundo um funcionário público triste e cansado, acumulou-se muita gente para o dia posterior. Sabe como é. Povo deixa tudo pra morrer de última hora, ai fica essa zona.

Os burburinhos começaram logo após cinco minutos de espera:

– Olha, terceiro dia que venho aqui, quero ver se de hoje não passa. Se quebrar de novo vou procurar meus direitos – dizia uma senhora, segurando uma bolsa vermelha e com cabelos loiros mais artificiais que Ki-suco de uva.

Logo atrás dela, estava Salvador Silva. Um latrocida, omicida, patricida e filho da dona Cida. Preso e condenado por inúmeros crimes, inclusive o de derrubar um avião com um lança granadas. Quieto ele não conseguia ficar:

– Grr, é hoje que eu mato essa cadeira – disse, espumando pela boca e contido de forma fofinha pelo policial.

Em outro lugar da fila, estava uma pessoa curiosa. Um homem, de chapéu e cabelos aparentemente negros. Mas suas costas se curvavam como a costa oeste da África e se apoiava em uma bengala bem destruída pelo uso excessivo. Ao falar com o jovem rapaz atrás dele, retirou o chapéu e a peruca rapidamente e mostrou os cabelos brancos:

– Olha, vim disfarçado pra não pegar fila preferencial. Não conta pra ninguém.

A fila deu a volta no quarteirão e já contava, obviamente, com vendedores de amendoim, cartão da C&A, três crentes girando e pessoas alugando roupas de borracha com a promessa de que no máximo você sentiria uma coceirinha na hora do churrasco interior. Cinco reais o aluguel, com devolução compulsória.

Perto das sete horas, horário em que finalmente a fila começaria a andar, a energia elétrica do bairro caiu. Um transformador estourou devido a forte ação do ar ao seu redor. E para surpresa de ninguém, o caos foi instaurado no local. Gritaria, reclamações e chutes em quem girava.

– Que país lixo! Não dá mais nem pra morrer em paz!

– Se eu to vivo, é culpa do PT!

– Vou voltar pra casa hoje e falar o que? Assim fica difícil!

– Se eu tiver vivo até as 8 da noite, o Procon vai ficar sabendo.

Mas ninguém arredava o pé da fila. Uma mulher até pediu segurarem o lugar, enquanto ia fazer as unhas e se depilar pra fazer bonito na hora da tremedeira.

Algumas pessoas receberam no whats app uma notícia que dizia que as cadeiras elétricas não matam de verdade, o que mata é o tiro que te dão depois. Na verdade é um grande esquema de compra de votos. Outro estudo sério do telegram dizia que cadeiras elétricas não tinham sido inventadas ainda e que ao entrar ali no local, você era raptado, virava cidadão Chinês e ia trabalhar fazendo iPhone.

Algumas pessoas pensaram em sair da fila, mas ninguém teve coragem de perder o lugar guardado com tanto esmero.

Deu dez horas da manhã, a energia elétrica voltou. Todos foram eletrocutados com sucesso até uma da tarde. Tirando o último da fila, que não foi executado porque acabou a cadeira travou no boot. Control alt del não funcionou e chamaram o técnico da Net.

– Grr, mundo injusto, grr – disse Salvador, babando.